Em breve ele será apenas o pó que veste o
corpo e nada mais terá a dizer afinal tudo se despede e o cadáver
grávido de amanhã não nos interessa.coragem é pensar e não mentir
ao menos para si quando tudo que é chão trai e o espelho cheio de
sarcasmo chama pra conversar e não te responde mais. é o que ele pensa. a
mais arrogante ingenuidade. sua crença cairá no último fio de cabelo
como uma praga purgando suas dívidas. todas. para que assim aprenda como
nunca. e ao sussurrar no espaço aéreo
de uma overdose: perdoei-me. engendre apenas a pronúncia de uma
conjugação obsoleta incrustada no mais remoto de seu passado. como um
trauma de infância. um crime inconfessável. uma perversão engolida no
sêmen de cada noite. patético. só agora percebe: não sabe mais dizer
amém, amem. talvez achar que sabia tenha sido sua maior ilusão. dentre
todas. todas. favor não ter pena dele. não é necessário. na vida real
esse tipo de depoimento classifica-se como melodrama barato. não se meta
medo. não se meta nisso. o que se pode fazer. azar? o nosso que nunca.
acho que significa até uma espécie de sorte pra ele. sim. uma sorte como
uma navalha, uma gravata, um vidro todo de calmantes na hora exata em
que a fuga solicita. exige. sabe o que é? é o que vale: nada de esquecer
nossos umbigos. não serve. ele só sacou como a coisa toda caminha. só
isso. deixe-o às voltas com suas próprias mãos. ninguém precisa se sujar
além daquele balde de lama que recebeu ao nascer para equilibrar sobre a
cabeça e com o qual deve se desdobrar até o último tropeço. o que
podemos pensar? nele? já disse que não vale nossa pena. resolve-se antes
de nós, inclusive. e para nossa inveja silenciosa, despeitada,
escondida sob o falso espanto e a piedosa reprovação. ele saberá
extraviar-se. é a coisa. a única que a gente nunca desaprende. parece
até que sempre começamos de um jeito diferente para encerrar assim. mas
não vou falar de certezas. tenho medo. digo que parece. basta. ele
começou assim: dizendo o que era. o que não era. conversas de crer. vê. é
possível? quero rir. muito. não dá pra ser menino toda vida. entre a
praga e a paga esperto é quem sai de cobrador. trate de sufocar qualquer
misericórdia. piedade é para quem tem ganas de se jogar das alturas
esperando asas. talvez anjos. sendo que o tesão está em pisar bem essa
terra estuprada. abraçar o corpanzil suculento de nossa crueldade. ser
gente como gente de fato deve ser. chaga e imundície. famintos por
desgraças. saiba que já se foi o tempo de serventia dos heróis. e
falando em tempo. esse que é nosso não passa de uma grande porcaria
esvaindo-se como um vazamento de privada. entende agora? nada mais que
fezes. não pense mais nele. certo? em breve será apenas o pó que veste o
corpo e nada mais terá a dizer. você tem que se conformar. Não? Nunca?
Aí sim o azar passa a ser teu também. E eu não quero fazer nada. Eu só
estou aqui para cobrar.
Jonatas Onofre
Jonatas Onofre
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