O atlântico atravessando este continente
este continente que jamais suicidará a culpa
dormir não se sabe sob estas nuvens
digo
dormindo não se sobe tão alto.
Carlos Nascimento
sábado, outubro 24, 2015
sexta-feira, outubro 23, 2015
Considerações sobre o poeta (r)existindo
Ocorreu-me
agora – bem agora – que estou outro. É certo que venho repetindo – quase – isso
há dias para mim e para alguns. Mas não me refiro ao sujeito – ao elemento que
aceito ser nas cadeias todas que me prendem ao curso natural da existência – Não
estou falando do eu que pode ter umas consciências. Tudo isso muda.
Absolutamente: tudo isso passa.
Avançamos, regredimos, aprendemos, esquecemos, desprezamos... As ideias
atravessam a cabeça. Os desejos exigindo respostas ágeis e práticas do corpo
também sofrem alterações. A fome de entender o que nos cerca continua muito
parecida com uma espécie peculiar de libido: hora ou outra entra em conflito
com as parte mais racionais e frias da carne, excita nos locais mais
improváveis, nega seus fogos e artifícios no momento preciso e produz orgasmos insólitos
(como se todos não o fossem) quando nem se pensava naquilo. Aquilo entenda-se
isso: a vida mesmo. O que não ajuda em nada quem ainda quer captar o que eu
tento apontar aqui. Sei. Insisto no óbvio: mudamos, sabemos que mudamos –
embora às vezes a percepção disso seja tardia – e aceitamos a necessidade de mudança.
Eu por exemplo (como estava tentando dizer) só agora percebo que o poema –
assim como os corpos belos ou grotescos com os quais lidamos quase sempre ou
quase nunca – interfere profundamente nesse processo. Vejamos: Meu poema me
altera o jeito de encarar certa atitude humana que ontem me espantava hoje me
enoja e eu, de forma muito ingênua –para não dizer patética – penso que
disponho de todas as suas maneiras. Os poemas alheios me constrangem na
dimensão absurda de suas revelações sobre mim, sobre o que sinto, sobre o que
ainda ouso defender. Como leitor eu nunca sou/serei o mesmo. O maior risco de
permitir a invasão do texto nesses terrenos perigosos do sentimento é o extravio de qualquer chão.
Eu poderia jurar – antes – que estava imune a esse tipo de magia negra. Que
obra alguma teria tal poder ou permissão de minha parte para devassa tão
profunda de coisas minhas “de verdade”. É claro que ao escrever eu poderia ter todos
os feitiços possíveis a meu dispor, porém não seria bobo de deixá-los virarem
sobre minha própria cabeça. Engano – muito engraçado para os outros – quase
trágico para quem o engendra. Agora não é só o acontecimento “normal” (já que o
poema é muito um acontecimento também, mas de “aberração”, uma anomalia
provocativa), não é só a fossa, o porre, a bancarrota que atravessam a gente
num plano mais pragmático, é também esse distúrbio nas pupilas dilatadas, esse
instante de possessão demoníaca ou coisa (desa)parecida, essa incontornável
overdose de imagem, som e sentido. Descubro que estava correto quem não quis
contar: o poema nem carece de (r)existir, (assim como não carece de cigarros e
doses mais fortes de bebidas quentes). O poeta? Sim? De quase isso tudo? (r)existir
soa melhor que meramente existir ou resistir. Ser outro na constatação: estou de
pé no mesmo lugar ou de volta ao lugar anterior, mas não sendo mais – nunca – o
mesmo. estar outro. A cada leitura. A cada palavra assentada no subsolo da voz
na folha. Acho que tem muita beleza o gesto de admitir isso ao mesmo tempo em
que é melodramático. Tragicômico? Homem aceitando fragilidade é sempre assim?
Não se meta a escrever quem não tem estômago para se olhar nos espelhos. Aceitar
a possibilidade de os estilhaços não colarem é um passo interessante. O
primeiro, acredito com mais força agora,
é dizer que não reconheço mais quem escreveu a primeira frase desse texto.
quinta-feira, outubro 22, 2015
[Já olhaste profundamente para
as riscas da tua mão?]
Guarde a risada
para depois de
talvez
e não faça mais
perguntas,
não queira saber
de que lado
partirá a próxima
mão a estalar
na tua cara
as riscas da tua mão?]
Guarde a risada
para depois de
talvez
e não faça mais
perguntas,
não queira saber
de que lado
partirá a próxima
mão a estalar
na tua cara
não percebes que
as coisas, as pessoas
e os cães andam
cada vez mais
mordidos por essas
luas?
Tu insistes
em lhes oferecer
a carne dos braços,
os véus
dúbios do sexo
e as vogais
raquíticas, semi-
áridas da
garganta
Eles só
conhecem o que
é dentes,
ranger de dentes,
fome e essa espécie
de gente, ou
presa, a que
pertences, sim
tu és destes
que nunca crescem,
ficam idiotas,
suspensos
no ar de alguma
infância obscura
e por isso sempre
servem bem como
pasto
para as feras
Será que só
aprendes quando
estás
com o pescoço
entre mandíbulas?
Quantas vezes mais
tua mão evitará
o golpe tranquilo
entre os
olhos?
Não insista na
tolice de
ignorar o que
as riscas, os
garranchos,
as elipses
entre teus dedos
querem dizer
isso que pensas
ser
sorte, pode muito
bem significar
apenas
um leve atraso
daquilo
que nunca pede
licença
para acontecer
Jonatas Onofre
as coisas, as pessoas
e os cães andam
cada vez mais
mordidos por essas
luas?
Tu insistes
em lhes oferecer
a carne dos braços,
os véus
dúbios do sexo
e as vogais
raquíticas, semi-
áridas da
garganta
Eles só
conhecem o que
é dentes,
ranger de dentes,
fome e essa espécie
de gente, ou
presa, a que
pertences, sim
tu és destes
que nunca crescem,
ficam idiotas,
suspensos
no ar de alguma
infância obscura
e por isso sempre
servem bem como
pasto
para as feras
Será que só
aprendes quando
estás
com o pescoço
entre mandíbulas?
Quantas vezes mais
tua mão evitará
o golpe tranquilo
entre os
olhos?
Não insista na
tolice de
ignorar o que
as riscas, os
garranchos,
as elipses
entre teus dedos
querem dizer
isso que pensas
ser
sorte, pode muito
bem significar
apenas
um leve atraso
daquilo
que nunca pede
licença
para acontecer
Jonatas Onofre
terça-feira, outubro 20, 2015
um copo seria
o suficiente
para diluir
o gosto da
caligrafia,
fazer chover
no cárcere
deste atraso,
devolver
o inferno
aos abissais.
essa calma
tropeça,
memória
pende feito
grão, móbile
à barlavento.
o corpo resiste
ao ímpeto do sal;
mas não há
oceano que
saiba regar
esta casa.
um copo seria
o suficiente.
um copo,
mais nada.
Camillo José
o suficiente
para diluir
o gosto da
caligrafia,
fazer chover
no cárcere
deste atraso,
devolver
o inferno
aos abissais.
essa calma
tropeça,
memória
pende feito
grão, móbile
à barlavento.
o corpo resiste
ao ímpeto do sal;
mas não há
oceano que
saiba regar
esta casa.
um copo seria
o suficiente.
um copo,
mais nada.
Camillo José
segunda-feira, outubro 19, 2015
[a fúria do peixe]
se tentam ferir
meus pés
não procuro
acordos de paz
falar tem se
tornado cada vez
mais
um mero ganir
pelas sombras
e eu já tenho
fastio demais
para responder
ainda mais por
saber que
há tempo de ouvir
o que ninguém tem
coragem de anotar
e há tempo de
esquecer como
chamar alguém
pelo nome
não descuidarei
posso jurar
que algum rosto
escora uma porta
e sorri de mim
sou mesmo
uma fé que fere
há que se pagar
o preço de não
subir
à superfície para
respirar
se tentam ferir
meus pés
não procuro
acordos de paz
falar tem se
tornado cada vez
mais
um mero ganir
pelas sombras
e eu já tenho
fastio demais
para responder
ainda mais por
saber que
há tempo de ouvir
o que ninguém tem
coragem de anotar
e há tempo de
esquecer como
chamar alguém
pelo nome
não descuidarei
posso jurar
que algum rosto
escora uma porta
e sorri de mim
sou mesmo
uma fé que fere
há que se pagar
o preço de não
subir
à superfície para
respirar
domingo, outubro 18, 2015
another castle
tua beleza me dói
como um tijolo
tua beleza me dói
como um tijolo
maciço de 16 bits
sobre as falanges,
esta nívea candura
é pêssego radioativo,
amanita muscaria
para desavisados;
piedade, miss
murder, piedade.
não me condene
ao nomadismo
esquizo-paranóide
desta tortuosa estrada
de encanamentos,
me poupe do egoísmo
de sacrificar estes laços
jurássico-familiares
pela irreverência
de um checkpoint.
este paraíso está
por um glitch, let's
make the best of
the situation before
we finally go insane.
a solidão virá a conta-
gotas - no poems for
a while - você sabe,
ninguém deveria
gastar sapatos per-
seguindo fantasmas,
dinamitando castelos,
aborrecendo auroras.
Camillo José
sobre as falanges,
esta nívea candura
é pêssego radioativo,
amanita muscaria
para desavisados;
piedade, miss
murder, piedade.
não me condene
ao nomadismo
esquizo-paranóide
desta tortuosa estrada
de encanamentos,
me poupe do egoísmo
de sacrificar estes laços
jurássico-familiares
pela irreverência
de um checkpoint.
este paraíso está
por um glitch, let's
make the best of
the situation before
we finally go insane.
a solidão virá a conta-
gotas - no poems for
a while - você sabe,
ninguém deveria
gastar sapatos per-
seguindo fantasmas,
dinamitando castelos,
aborrecendo auroras.
Camillo José
sábado, outubro 17, 2015
sábado, outubro 03, 2015
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